sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Do oratório à televisão: quem perdeu?

Paulo Henrique Chaves
Pesquisadora paranaense apresenta resultados impressionantes quanto aos efeitos deletérios da televisão sobre as mentes de crianças e jovens brasileiros
Poucos jovens hoje conhecem aquela miniatura de santuário junto à qual, no recesso sagrado do lar, nossos antepassados se recolhiam à noite, em oração. Fosse para agradecer a Deus os benefícios espirituais e materiais recebidos durante o dia ou para encomendar as almas dos familiares que partiram desta vida. Ou ainda para pedir e encontrar a solução para seus problemas e dificuldades neste peregrinar pela Terra e recobrar a paz depois das tribulações.
O anti-santuário da TV
Mas, a partir de meados do século passado — o XX —, o oratório foi sendo substituído por outro, muito pouco piedoso, que por vezes existe em quase todas as dependências da casa, e cujos “santos”, com seus maus exemplos, vêm norteando — melhor se diria desnorteando — o comportamento de milhões de pessoas.
Esse novo “santuário” encontra-se entre as invenções, ditas revolucionárias, que mais contribuíram para transformar as mentalidades de nossos pais e educadores e das próprias crianças. Com a televisão, Deus e sua moral foram postos de lado, numa tentativa de operar uma “redenção” do homem através da ciência e da técnica, a fim de torná-lo “livre”, numa sociedade atéia e dessacralizada.
Mas Deus não tardou a rir-se desses artífices da substituição. Diante da desagregação da instituição familiar e do conseqüente aumento do amoralismo, da agressividade, da violência e do caos, os cientistas sociais, em nome da mesma ciência tida por redentora, demonstram, como se fosse um teorema, a má influência da televisão enquanto ditando comportamentos.
Um cardápio televisivo envenenado
Assim, a Profª Paula Inez Cunha Gomide, do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná e pesquisadora do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisas), mediante sucessivas monografias sobre os efeitos da televisão em crianças e adolescentes, vem mostrando a influência deletéria dos programas violentos e imorais que enchem o cardápio dos programadores da TV brasileira.
“Cerca de 3.500 pesquisas — segundo a professora — relativas aos efeitos da violência na TV sobre os espectadores foram conduzidas nos Estados Unidos nos últimos 40 anos”.
Segundo ela, um número considerável de pesquisadores vem estudando os efeitos de filmes violentos no desenvolvimento de comportamentos agressivos das pessoas (Azrin et alli, 1965; Berkowitz e Alioto, 1973; Eron et alli 1972; Bandura e Iñesta, 1975; Geen, 1990; Iñesta, 1975; Friedrich-Cofer e Houston, 1986; Liebert e Sprafkin, 1988; Meddnick et alli, 1988; Snyder, 1991, 1995; Stifman et alli, 1966; Tulloch, 1995; Widom, 1989; Worchel et alli, 1976).
Desde 1997 a Profª. Paula Gomide desenvolve pesquisas, acompanhando estudos de especialistas mundiais, como os citados acima. Descreve ela suas recentes experiências, feitas separadamente com base em quatro grupos de adolescentes e outros quatro de crianças (em ambos os casos, 50% masculinos e 50% femininos). Foram medidos e comparados os comportamentos agressivos de cada um deles em partidas de futebol de salão, antes e depois de assistirem a filmes com diferentes graus de violência.
A pesquisadora chegou a significativos resultados, estatística e cientificamente estudados e analisados: “Em dois grupos experimentais as diferenças entre os sexos foram significativas, ou seja, após assistirem aos filmes TIMECOP e KIDS (com alto teor de violência), os adolescentes apresentaram comportamentos agressivos bem superiores aos índices apresentados pelas adolescentes. Porém, no que se refere tanto ao grupo de controle (que jogou sem assistir a nenhum filme) quanto aos sujeitos que assistiram a ÁGUAS PERIGOSAS (teor baixo de violência), a média dos comportamentos agressivos para os dois sexos foi semelhante.”
E prossegue: “Comparadas as médias dos comportamentos agressivos do grupo controle feminino com os três grupos experimentais do mesmo sexo, as diferenças entre elas não eram significativas para dois grupos, a saber: ÁGUAS PERIGOSAS e TIMECOP. No entanto, quando a comparação foi feita com as adolescentes que assistiram ao filme KIDS, a diferença mostrou-se estatisticamente significativa.”
Pediatra sugere “livrar-se do aparelho”
A pesquisadora mostra ainda que, analisando grupos das crianças nos jogos de futebol em que foram observadas, antes e após assistirem a filmes violentos e não violentos, “as meninas não alteram seu nível de comportamento agressivo em função de filmes violentos que envolvam lutas, mesmo que existam modelos femininos nestas encenações. Já para as crianças do sexo masculino, o filme violento tem um efeito positivo, estatisticamente significativo, no que se refere ao aumento da agressividade”.
Embora a autora não tenha ressaltado o porquê da diferença de comportamento masculino e feminino, fica evidente a desigualdade psicológica natural entre os dois sexos, coisa que o feminismo procura negar.
Em outro estudo — Crianças e adolescentes em frente à TV: o que e quanto assistem de televisão — nossa pesquisadora mostra que o grupo analisado fica, em média, 26h46m semanais diante do televisor. Isso equivale a passar mais horas diante do vídeo do que nas salas de aula.
Benjamin Spock, pediatra americano citado pela pesquisadora, chega a afirmar: “Até que a TV venha a ter programas interessantes e úteis para as crianças, os pais podem simplesmente se livrar do aparelho. Isto evitará que seus filhos sejam brutalizados pela violência e que se tornem passivos por longas horas de imobilizada atenção”.
A pesquisadora lembra que a maior influência da TV no comportamento humano é indireta, sutil e cumulativa. Cita Strasburger (1999): “Toda televisão é televisão com fins educativos. A única questão é: O que ela está ensinando?” E conclui: “A tragédia da televisão é que ela é 90% potencialmente prejudicial a crianças e adolescentes, e apenas 10% útil socialmente”. Avalie, leitor, o percentual e o tipo de influência que o tradicional oratório poderia exercer sobre as mesmas pessoas...
“Os norte-americanos têm a taxa mais alta de assassinatos que qualquer outra nação do mundo. Entre os jovens, o homicídio é a segunda causa de morte, sendo a de número um para os negros. Os adolescentes são responsáveis por 24% dos crimes violentos. Paralelo a este fato, uma criança norte-americana comum terá visto, ao terminar o primeiro grau, mais de 8.000 assassinatos e mais 100 mil outros atos de violência na TV (Wartella, Olivarez & Jennings, 1999).”
Quando o aparelho “quebra”, renasce o convívio
Consta também dos trabalhos da Profª Paula Gomide uma apreciação sobre os programas preferidos por 825 crianças e adolescentes brasileiros, de idades entre 7 e 17 anos. Os referidos programas foram analisados por professores, mestres e doutores com formação na área da educação e da família, de cujos pareceres transcrevemos alguns trechos:
l Programa do Ratinho: “Os conteúdos tendem a ser explorados de forma sensacionalista, procurando expor cenas chocantes que sensibilizem o público. .... Toda situação tem múltiplas facetas, mas o apresentador acentua apenas o lado mais chocante e pesado do fato, o tempo todo estimulando reações de revolta e indignação dos telespectadores em relação ao tema, ao apresentar a sua opinião sobre o assunto, bem como conclamando a que se posicionem contra ‘esta barbaridade’ (um dos clichês verbais do apresentador)”.
l Programa Angel Mix: Entre outros problemas, “são conhecidos casos de crianças bem pequenas que se limitam a repetir os ‘teletubbies’ sem avançar (em seu desenvolvimento natural).”
Como fecho do seu trabalho sobre a influência da TV sobre as crianças e adolescentes, a autora narra: “Uma mãe americana, preocupada com o papel que a televisão ocupava em sua família, ‘quebrou’ propositadamente o aparelho por uma semana, buscando alterar, assim, as relações familiares já estabelecidas em torno da televisão. Para sua surpresa e contentamento, após uma semana sem televisão, ela observou que um de seus filhos havia começado a praticar piano, a outra filha lia revistas, e ambos brincavam juntos, criando novas formas de brincar. À noite, ao jantar eles conversavam, depois ouviam música, liam, e então perceberam que a vida continuava independentemente da televisão. Removeram o aparelho para a garagem e acostumaram-se a ler mais, ouvir rádio, ir ao cinema, assistir a jogos e falar sobre eles mesmos; e perceberam, sobretudo, quanto tempo a mais eles tinham para conviver (Richards & Sandy, Cambridge University Press, New York, 2000, p.45).”
Os dados apresentados são altamente significativos e falam por si. Para terminar, um comentário sobre o oratório antigo e o novo “oratório” eletrônico.
Ao invés de unir e elevar, como fazia o oratório, a televisão rebaixa e destrói; ao invés de harmonizar e educar os filhos para Deus e para a sociedade, leva-os à discórdia, à revolta, à depravação moral, à violência e à completa subversão da família.
O novo “oratório”, usurpador e irreverente, expulsou para antiquários e museus os antigos oratórios que atraíam as graças. Aboletando-se em seu lugar, começou a disseminar desgraças...


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